sexta-feira, 1 de julho de 2011

Uma noite de luxúria


Aconteceu.
Era uma tarde qualquer, lá pelas cinco horas, não lembro ao certo, descia eu pela Rua Augusta, ouvindo o tilintar das moedas, havia esquecido completamente. Estava distante, absorta em meus turbilhões de pensamentos, olhando para baixo, na verdade para os meus pés. Não tinha reparado que o cadarço estava por amarrar, o que não era novidade, mais uma vez estava atrasada.
Apressei o passo quando meu celular tocou.
Era ele.
Eu estava mesmo esperando.
Eles sempre ligam de volta.
Sorri com desdenho, fazia parte de meu peculiar triunfo ter os homens na palma das mãos.
Homens loiros, morenos, negros, japoneses, todos me divertiam.
Diversão.
Não me julgue.
Apenas cansei de tanta gente chata, dessas que querem ser sérias demais, moralistas e viscerais o tempo todo. Eu não quero comprar livros de auto-ajuda, não quero conselhos de como devo agir, como devo pensar, eu não sou um fantoche, estou dispensando soluções para os meus problemas.
Quero sentir cada mínimo detalhe como eles realmente são passageiros.
A vida é passageira, e eu sou uma passageira da vida. Com passagens compradas para destino algum.
Quero a simplicidade de uma vida comum. Cansei dessa farça toda.
Utopia?
Pode até ser. Mas daqui pra frente, não depende de ninguém.
Depende de mim.
Não estou à toa nessa vida, não é pelo dinheiro, é por pura... Esquece! Você não entenderia.
Não tenho rotinas, não preciso dar satisfações a ninguém, sou sozinha. Não sou especialmente íntima de alguém, e sinceramente, nunca desejei intimidades. Desejei conversas.
Eu só queria conversar. Podia ser sobre futebol, carros, só não queria falar sobre mim. Não me sinto a vontade.
Ao chegar em casa, era preciso apenas me acomodar na poltrona e esperar das oito até as dez da noite, todos os dias da semana, na mesma sala de estar tomada por inúmeros fragmentos que pareciam se juntar, criando uma redoma de vidro.
Eu ali estava protegida. Protegida.
Uma noite de luxúria, isso te assusta?
Pois não deveria, agora me responda que menina, nunca sonhou viver um conto de fadas, com direito a final feliz, em meio a fantasias, príncipes e carruagens?
Um mundo onde tudo é possível, sem precisar se questionar, independente de limitações?
Quem dera, quem dera! Eu respondia ao mesmo tempo em que abria aquele vinho que tinha ganhado a poucos dias de um “affair”, nada sério, romance- casual-se-é-que-me-entende. Abri o armário, escolhi o jogo de taças de cristal a dedo, pintei os lábios de carmim e soltei o cabelo.
Acendi as velas do castiçal, e esperei a campainha tocar, enquanto me perfumava.
Pacco Rabanne, também tinha meus luxos.
Espiei ansiosa pelo “olho mágico”, ele trazia flores e chocolates.
Chocolates, péssima escolha.
Eu detesto chocolate.
Abri a porta com um falso sorriso, enquanto ele mantinha seu olhar preso em meus lábios carmim.
A sua voz rouca tomou meu ouvido com “piadinhas” obscenas.
Convidei-o a entrar, ele logo se acomodou no sofá, desabotoou a camisa e afrouxou a gravata.
Ele sequer perguntou como eu estava, foi pedindo algo para beber.
Tudo bem.
Me dirigi até a cozinha com certo prazer, ergui a taça e brindei ao vento.
A vida! Tim-Tim
A vida que é feita por um começo, meio e fim.
Seria o começo, de um fim mal acabado.
Estendi a mão, e dei-lhe a taça.
Acendi um cigarro enquanto olhava para a sua mão.
Uma aliança.
Abri a porta e mandei-o sair.
Bebi alguns goles. Retoquei o batom. Fechei à persiana. Apaguei o cigarro, e fui dormir. Não havia mais aquela mulher sentada na poltrona, protegida por uma redoma de vidro.
Meretriz. Prostituta. Cortesã. Bisca. Garota de Programa. Vagabunda. Rampeira.
Não.
Nem uma nem outra.
Mulher. Apenas mulher.


8 comentários:

  1. "A vida é passageira, e eu sou uma passageira da vida." E o período que permanecemos nela é temporário, fulgaz, a gente precisa ser imediato. Sem medos, sem limites.
    Adoreeeei o texto! Você nos apresentou um personagem peculiar, interessante e cheio de personalidade com suas bem colocadas palavras... (L)

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  2. "Apenas cansei de tanta gente chata, dessas que querem ser sérias demais, moralistas e viscerais o tempo todo. Eu não quero comprar livros de auto-ajuda, não quero conselhos de como devo agir, como devo pensar, eu não sou um fantoche, estou dispensando soluções para os meus problemas."

    Sem mais. Feliz um ano de blog! ;)

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  3. Quero a simplicidade de uma vida comum. Cansei dessa farça toda.
    Utopia?
    Pode até ser. Mas daqui pra frente, não depende de ninguém.
    Depende de mim.

    Absurdamente verdade:Parabens comemorando um ano de blog!

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  4. Não consigo escrever nada, só digo que fiquei impressionado do início ao fim. Simplesmente FODA! Não, não, MUITO FODA! Sério... curti demais.

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  5. "A vida é passageira, e eu sou uma passageira da vida. Com passagens compradas para destino algum."

    Sem palavras para descrever, seus textos são incríveis Loara. (L)

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  6. Ain,
    te falo pessoalmente depois, mas AMEI.

    ps.: morro de orgulho dos seus textos ^^

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  7. Eu amei! Adoro seu estilo de escrever me identifico com muitas coisas...mudando o gênero de feminino para masculino poderiam ser frases minhas! hahahaah

    Beijo!

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  8. brindo a este e aos próximos, muitos e produtivos anos de escrita que estão por vir.
    Beijo grande, guria!

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